segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Paraense do Acará foi pioneiro nos estudos que permitiram o homem voar

“Senhoras e senhores, sejam bem-vindos a Belém. Em instantes, pousaremos no Aeroporto Internacional Júlio Cezar Ribeiro de Souza”. Para que os passageiros ouçam essa mensagem no avião ao chegarem à capital paraense é preciso que um projeto de lei seja aprovado no Congresso Nacional. Mas, se isso acontecer, soará estranho para alguns que vão se perguntar: “Quem é esse Júlio César?”.
O maior sonho de Júlio Cezar Ribeiro de Souza era ver Belém do alto. Isso no tempo em que botar os pés na capital da Amazônia era o sonho de muita gente. Ele é considerado o autor da primeira tentativa de desenvolver um projeto de balão dirigível no Brasil. A angústia de Júlio por não conseguir voar foi digna de um romance.
Júlio Cezar nasceu em 1847 e veio do município ribeirinho do Acará para estudar no Seminário do Carmo, em Belém. Percorreu o caminho que muitos jovens do interior da Amazônia fazem até hoje. Chegou de barco em um dos portos da capital, que começava a sentir os efeitos da era da borracha. Do seminário, partiu para a Escola Militar no Rio de Janeiro em 1862. Ele foi poeta, escritor, jornalista, professor, servidor público conceituado e soldado na guerra do Paraguai. Mesmo assim, queria voar mais alto - literalmente.
Em 1866, ao concluir o curso na Escola Militar no Rio de Janeiro, Júlio Cezar seguiu para Montevidéu, no Uruguai, onde integrou as forças militares brasileiras na Guerra do Paraguai. A situação, que parecia um pouso forçado na carreira do paraense, foi um marco para o resto de sua vida: foi durante a guerra, em 1867, que houve o primeiro uso militar de balões de observação na América do Sul.
Anos depois de transformar sua paixão pelos balões em teorias, Júlio Cezar publicou um trabalho sobre dirigibilidade aérea em 1880. Em 29 de julho do mesmo ano, começou a batalha para expor e provar as suas pesquisas. Solicitou audiência com representantes da então província do Pará e realizou experimentos com pequenos balões. Tentou inflar um maior ainda, porém o gasômetro da cidade não produziu gás suficiente para o experimento. Com isso, ele decidiu buscar patrocínios para alçar um novo vôo – desta vez, a França era seu destino.

Franceses plagiaram obra do inventor

Na cidade de Paris, em novembro de 1881, Júlio Cezar levantou o balão “Victoria” de dez metros de comprimento e dois de diâmetro. Após a experiência, o inventor foi aclamado pela imprensa parisiense e se tornou membro da Sociedade Francesa de Navegação Aérea. Depois, Júlio volta a Belém em busca de financiamento para as suas experiências e deixa uma encomenda na casa Lachambre: a construção de um grande dirigível que seria capaz de realizar o sonho de muitos homens – voar.
De volta ao Pará, no Natal de 1881, Júlio Cezar repetiu os experimentos com o balão “Victoria”. A imprensa de Belém ficou entusiasmada. Em 29 de março de 1882, o paraense foi mais uma vez ao Rio de Janeiro, onde apresentou o “Victoria” a um grande público na Escola Militar. Um dos espectadores era o imperador Dom Pedro II, que era fascinado por ciências e tecnologia e poderia ser o motor definitivo para o inventor cruzar o céu brasileiro. Após a conclusão da construção do grande dirigível, que se chamava Santa Maria de Belém, Júlio Cezar o trouxe para a capital paraense. Em 1884, tentou realizar o experimento na terra natal, no bairro da Cidade Velha, mas fracassou: ele não conseguiu encher o balão com os três milhões de litros de hidrogênio necessários para levantar o vôo.
Além do fracasso, ainda viu sua obra ser plagiada pelos irmãos franceses Charles Renard e Arthur Krebs. O vôo do “La France” foi realizado em 9 de agosto de 1884. Os dois foram apoiados por militares franceses que negligenciaram a patente reconhecida três anos antes, na própria França, em favor de Júlio Cezar. Indignado, o inventor paraense escreveu o artigo “A Direção dos Balões” divulgado pela imprensa paraense e encaminhado ao Instituto Politécnico Brasileiro. Foi assim que Júlio começou mais um vôo, dessa vez, em busca do reconhecimento perdido. Só que ele morreu em 1887, sem conseguir essa façanha, e ficou esquecido na História do Pará.

Primeiro projeto sobre o assunto é de 1959

Quem iniciou o levantamento sobre os projetos e a trajetória do inventor foi o pesquisador Fernando Medina do Amaral, já falecido, que estudou a vida de Júlio Cezar por 25 anos. O físico Luís Bassalo Crispino, professor doutor da Universidade Federal do Pará (UFPA), deu continuidade aos estudos de Fernando e lançou um livro sobre a vida do inventor em 2003. A partir disso, ele passou a divulgar a biografia de Júlio Cezar para estudantes, pesquisadores, veículos da imprensa e revistas científicas.
Segundo Crispino, a intenção parlamentar de batizar o Aeroporto Internacional de Belém de “Júlio Cezar Ribeiro de Souza” já existe desde 1959, quando o senador paraense Lobão da Silveira, que era jornalista, criou um projeto de lei (PL) com esse objetivo. A matéria foi arquivada no mesmo ano por motivos desconhecidos. Até hoje, o PL ainda pode ser visto na página do Senado Federal.
Só nos anos 80, Júlio Cezar foi homenageado com uma medalha comemorativa no governo de Alacid Nunes e um medalhão que está na praça da Bandeira, no bairro do Comércio. “Também houve a denominação do aeroporto de pequeno porte. Aí a coisa ficou meio difícil, porque como já existe um aeroporto com nome dele, o internacional não poderia ter”. De acordo com Crispino, a solução seria batizar o aeroporto pequeno de “Brigadeiro Protázio Lopes de Oliveira” e o maior de “Júlio Cezar Ribeiro de Souza”.
Foi o próprio Crispino que mandou a sugestão do projeto para a então senadora Ana Júlia Carepa. O PLS 326/2005 foi aprovado no Senado Federal e chegou à Câmara dos Deputados como PL 410/2007. Como manda o regimento da Casa, foi aprovado pela Comissão de Viação e Transportes e também pela Comissão de Educação e Cultura. Mas quando chegou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), no dia 19 de março deste ano, foi retirado temporariamente de pauta. O motivo: na lista de projetos para serem aprovados havia um que pedia que o Aeroporto Internacional de Belém se chamasse Rômulo Maiorana, empresário pernambucano morto em 1986.
Fonte: Diário do Pará

sábado, 3 de janeiro de 2009

Fidel é papa chibé?

Fidel, um brasileiro?

Pesquisadores afirmam que o ditador cubano teria nascido em Tracuateua, no Pará. Políticos locais já querem mudar o nome da cidade para Fidelândia
Ángel Castro, um espanhol bem-apessoado, chegou a Tracuateua, no Pará, no início da década de 20. Naquela pequena vila da região amazônica, onde trabalhou como barqueiro, ele conheceu Delphina Smith, uma descendente de alemães, com quem se casou e teve um filho chamado Fidel. A família se mudou para Iquitos, na região amazônica do Peru, e sua trajetória se perdeu no tempo. Décadas depois, aquele mesmo menino, transformado em um homem corpulento e barbudo, liderou um grupo de guerrilheiros em Sierra Maestra, derrubou o ditador Fulgencio Batista e implantou uma revolução socialista em Cuba.

Ángel Castro


Essa inusitada versão é levada a sério por um grupo de pesquisadores paraenses. A história corre de boca em boca na região há décadas. Dagoberto Smith, irmão de Delphina, ainda vive na zona rural de Tracuateua. Diz ter 100 anos e está lúcido, embora com a memória embaralhada. Jura que guarda em casa cartas enviadas pela irmã e algumas poucas fotos em preto e branco do sobrinho famoso. Durante muito tempo, com medo de repressão do governo militar brasileiro, ele se recusou a mostrar esse material e a conversar sobre o assunto. Homem matuto e desconfiado, vai aos poucos perdendo o receio. Dagoberto conversou na semana passada com um repórter do jornal La Vanguardia, de Barcelona, na Espanha. Também gravou um depoimento para um documentário dirigido pelos historiadores Dantas e Jesse Feitosa, pai e filho. Outro historiador, Edilson Silva de Oliveira, está reconstituindo a história da família Castro paraense. Meses atrás ele deu uma entrevista sobre o tema à rádio Pérola, de Bragança. Depois disso, mais de três dezenas de ouvintes entraram em contato com a emissora para dar outros detalhes de velhos casos contados por seus pais e avós.
A história oficial do ditador cubano é contada pela pesquisadora carioca Claudia Furiati, autora de sua única biografia autorizada. Ela passou quatro anos em Havana e teve acesso a inúmeros documentos, entre eles duas certidões de Fidel. A primeira aponta o nascimento dele no dia 13 de agosto de 1927 e foi lavrada na província de Cueto, em Cuba. A segunda, com uma data posterior, foi acertada com o juiz da comarca para que o aplicado estudante passasse uma série na frente dos colegas de classe. De acordo com essa versão, Ángel Castro era um jovem soldado espanhol quando foi enviado a Cuba para lutar na Guerra da Independência, no fim do século XIX. Depois retornou à terra natal, mas por pouco tempo. Logo voltou à ilha. O ex-soldado trabalhou como operário da construção civil, comprou terras e enriqueceu. Casou-se pela segunda vez com Lina Ruz González, uma camponesa que trabalhava para ele. Fidel foi o terceiro dos seis filhos do casal e recebeu esse nome em homenagem a um amigo e sócio de Ángel.


Claudia Furiati, não concorda com a versão paraense


Logo depois do lançamento do livro, Claudia foi procurada por Sandro Castro, um paraense que se dizia sobrinho de Fidel. "A história me pareceu interessante, mas muito fantasiosa", conta. "Não bate com os documentos que pesquisei. Pode se tratar de uma coincidência de nomes, de um parente ou mesmo de uma parte obscura da trajetória de Ángel Castro. Não existem registros de passagens dele pelo Brasil, mas isso pode ter acontecido."
A suposta família paraense do ditador cubano é numerosa. Delphina, a mãe de Fidel na versão amazônica, tinha um irmão, Pedro Smith, já falecido. Sua esposa, Isaura Smith, conhecida na região como Lili, ainda vive. Esses "parentes" contam passagens tão épicas quanto inverossímeis, com datas e percursos imprecisos. No Peru, Ángel e Delphina teriam se separado. O aventureiro espanhol teria vagado por alguns anos pela América Latina. Quando soube que o filho estava internado em um colégio religioso, teria voltado ao Peru, para raptá-lo e levá-lo a Cuba.

Fidel Castro

Uma vez no poder, Fidel teria despachado Ernesto Che Guevara ao Pará para apagar os vestígios de sua origem brasileira - sabe-se lá por quê. Ele teria sido responsável pelo incêndio que destruiu centenas de documentos no cartório de Santa Maria da Foz do Tauari, no município de Gurupá, nos anos 60. Che esteve realmente no Brasil nessa época, mas para receber a ordem do Cruzeiro do Sul das mãos do presidente Jânio Quadros. Não há registros de passagens pelo Pará. Lício Viana, um caminhoneiro de Tracuateua, no entanto, jura que chegou a dar carona a Che. Os pesquisadores querem comparar amostras de DNA da família Smith com as do líder cubano. Procurada por ÉPOCA, a Embaixada de Cuba no Brasil não quis se pronunciar sobre o assunto. Sem tanta preocupação com a veracidade dos fatos, políticos paraenses planejam erguer estátuas de Fidel e apresentar em breve um projeto de lei para mudar o nome de Tracuateua para "Fidelândia". "Seria uma homenagem à origem brasileira de Fidel e um impulso ao turismo local", diz o deputado João de Deus - coincidentemente, do Partido Socialista Brasileiro.


Retirado da Revista Época